A sobriedade imponente do edifício esconde uma profusão de tonalidades, formas e ruídos. O Mercado é uma criatura sem tempo, um organismo maleável aos desejos de cada germinação, como responso pronto ao desafio de um despique. Na praça central, entre as fanfarrices de vozes desfasadas, a república dos aromas proclama a sua independência pela copiosa paleta da natureza, conquistando as objectivas de quem chega, rendendo ao sapatinho e ao maracujá a reverente satisfação que identifica a verticalidade de cento e um horizontes na saia redita das vendedoras de flores.
Além, na outra praça, a loa dos homens do mar, atirada de canto a canto como bola de canhão em guerra de galeões. É um tumulto sem filtros, nivelado em tons de sangue sobre a pedra fria, entre os ecos trovejantes de um novo preço para o atum que acaba de chegar. Nesta casa dos paladares, os sentidos não se secam na brevidade da fotografia tirada nem da compra feita – vão além, viajam pelas índias de outrora, recebem a fé num credo que vive de uniões improváveis, juram grandezas, como fiéis depositários do segredo do anis. À superfície, baloiçando nas vagas da doçura, a lembrança da noite, na Festa que falta cumprir.